sexta-feira, 21 de setembro de 2012

GENTE COMO A GENTE




(Com a ajuda de Gerivânia Lins)

Qual o limite para a desumanização de alguém? Quando cruzamos o limite que nos distingue dos animais? Dentre inúmeras barbáries cometidas pelo ser humano (contra o próprio ser humano) uma que incomoda e muito, até pelo seu ranço medieval, é como se trata pacientes com deficiência mental no Brasil.





       Há pouco tempo, ao assistir uma reportagem ousada do jornalista Roberto Cabrini, fiquei na dúvida se estávamos no século XXI (com seus inúmeros adventos tecnológicos e médicos) ou em uma masmorra na Europa do século XXVI.





Tudo ali transpirava desrespeito brutal às pessoas extremamente necessitadas, portanto portadoras de necessidades especiais (mais carinho, atenção, interesse fraterno e não meramente profissional). O programa é o Conexão Repórter, do SBT. O Hospital em questão, o Vera Cruz,em Sorocaba(SP).O que se viu do começo ao fim foi,no mínimo,nauseante,devido ao desdém contra seres humanos perdidos em seus mundos individuais.Quando foi que nos tornamos tão insensíveis?





Automaticamente me lembrei do maior hospital psiquiátrico da história do Brasil (ao menos, o mais conhecido) o Juqueri, que também viveu dias tenebrosos.





Situava-se na Fazenda Juqueri, com 1.100 hectares ou 731 quilômetros quadrados de área. Tratava-se de uma instituição prestando atendimento aos municípios de Franco da Rocha, Francisco Morato, Caieiras, Cajamar e Mairiporã. Esses municípios formaram-se a partir do hospital.

Em 1981, o complexo contava 4.200 pacientes entre o Juqueri e o Manicômio Judiciário, instalados na mesma área. Em 1995,o diagnóstico  detectou 1.800 internos;em 1998, havia 1.411 internos (741 homens e 670 mulheres) e nenhuma criança. A maioria (47%) tinha entre 41 e 60 anos, estava sob os cuidados de 2.213 funcionários (médicos, técnicos e administrativos). Em 2005 um incêndio atingiu o setor administrativo do prédio do Hospital. Do edifício sobraram apenas as paredes estruturais e uma parte da cobertura do piso inferior. No mesmo ano, cerca de 500 internos foram transferidos para clínicas. A administração implantou um programa de resgate da cidadania de pacientes, funcionários e moradores. O funcionário passa por cursos de aperfeiçoamento profissional e os pacientes voltam cada vez mais ao convívio com a sociedade. Mas nem sempre foi assim.





Durante muito tempo as condições dos internos era a mesma que a de um campo de concentração. Tratamento a base choque elétrico e força bruta eram usuais.O desinteresse por parte dos “funcionários” era gritante.Tal qual como se lida com a população carcerária,não se procurava recuperar ninguém,apenas “confinar” seres humanos.Quando foi que ficamos tão indiferentes ao sofrimento humano?





Se isso já feria todo e qualquer direito que a pessoa (sã ou não) tinha naquela época, nos dias atuais isso caracteriza banalização e escárnio. Principalmente no que tange aos que trabalham com isso,e aqui a crítica é voltada apenas aos péssimos profissionais.Porque há os abnegados que lutam por melhores condições de tratamento para quem sofre de transtornos mentais.





Nos porões do Vera Cruz, desprezo pelos deficientes era condição ‘sine qua non’ para muitos pseudo profissionais. Enxergavam os internos como animais de laboratório. Encaram sua rotina de trabalho como algo sofrível e,como tal,descontavam suas frustrações em seres humanos cujo o crime maior que cometeram foi o de ‘não conseguirem interagir sozinhos na sociedade’.

No lugar de atenção, maus tratos. Ao invés de preocupação pelo bem estar dos internos, tortura. Em vez de buscar melhorar as condições dos pacientes, ausência completa de higiene e risco permanente com a segurança dos mesmos. Quando foi que essa letargia nos acometeu?





Na reportagem corajosa e oportuna, o produtor do programa mostra os horrores vividos por aqueles que vivem em estado de alienação, parcial ou total, e que são explorados, gerando revolta em quem assiste. Por ser extremamente escatológicas as imagens,me limito apenas a criticar.Mas o programa pode ser visto na íntegra no Youtube.Quando foi que a sociedade se tornou confortavelmente entorpecida?



Tamanho o impacto do jornalístico que o Ministério Público ao receber a denúncia entrou no caso e tomou as devidas providências. Isso é sinal que as coisas podem,e devem, mudar.





Em outra situação de descaso,o Ministério Público (sempre o MP) requisitou a desinstitucionalização de pacientes psiquiátricos abrigados irregularmente no Hospital de Custódia Heitor Carrilho,no Rio.Dentre as denúncias : não há equipes de saúde mental para implementar projetos terapêuticos,nem profissionais como psiquiatras e psicólogos na unidade.O MPRJ exige ainda que a prefeitura e o governo estadual apresentem cronogramas detalhados de projetos para os pacientes e cumprimento das medidas propostas para remoção dos internos em condição.

Já há na Comissão de Constituição e Justiça da Câmara, projeto que criminaliza pessoas por discriminarem deficientes mentais, inclusive aqueles que têm condição de reinserção social ou de doentes mentais em condição de reabilitação, e buscam adentrar o mercado de trabalho.

Nem todos os lugares são encarados como “depósito de loucos”. Muitas instituições tem por hábito respeitar os deficientes de maneira a ajudá-los em seu retorno ao convívio familiar.Visitei uma instituição em Americana (SP) em que era visível que os internos eram tratados com dignidade.E para mim foi uma experiência maravilhosa interagir com todos eles e com a equipe de profissionais sérios da unidade.

A chave para que uma situação vexatória como a do Hospital Vera Cruz não se repita é o respeito. Entender que as pessoas que lá estão precisam de apoio, ajuda, atenção, de fraternidade. Como todos os seres humanos. Uma das perguntas emblemáticas de Roberto Cabrini a um dos funcionários da instituição, que havia sido flagrado tratando mal os internos, foi o que resumiu a situação: ”Você deixaria seu pai ser tratado aqui, nestas condições?”. Ao fazer essa pergunta antes de maltratar um deficiente mental, talvez muitas pessoas passassem a agir diferente.


QUANDO FOI QUE NOS ESQUECEMOS DE QUE OS PORTADORES DE DEFICIÊNCIA MENTAL SÃO GENTE COMO A GENTE?




fonte- Wikipedia  /   www.direitocapital.com.br



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